Liberdade de Opinião 2
Em reacção às interrogações que levantei no post Liberdade de Opinião, o jamiroo tentou, n’A Tasca, transmitir a sua perspectiva sobre o assunto. Em poucas palavras, e caindo no exercício retórico, sempre duvidoso, de tentar compreender as intenções de terceiros, o que o jamiroo afirmou era que o despedimento do apresentador inglês e outros na mesma situação eram, no mínimo, compreensíveis. Compreensíveis porque, se bem que concorda em teoria com o conceito da liberdade de opinião universal, quando se trata de figuras públicas a questão era mais delicada. Visto que tais figuras públicas são passíveis de influenciar a população, elas teriam uma responsabilidade acrescida sobre os ombros. Responsabilidade tal, que a BBC não podia tolerar que uma pessoa que para todos os efeitos era uma das caras da estação, permanecesse nos quadros. Posto isto e, mais uma vez, correndo o risco de não ter transmitido integralmente o sentido do post, devo afirmar que não concordo. Não posso concordar.
Vamos por partes. É certo que, como modelos para muitas pessoas, algumas personalidades que por causa da sua ocupação estão mais expostas ao olhar do público deviam ter mais cuidado comas afirmações. Simplesmente, do deviam a serem punidas por isso vai um longo passo. Eu posso discordar e achar totalmente irresponsável uma qualquer declaração, mas não posso aceitar que a pessoa perca o emprego por isso. Pior ainda se considerarmos que a BBC é uma empresa pública, paga por todos os cidadãos. Numa empresa privada, não devo, mas posso recusar-me a aceitar uma pessoa pela razão mais estúpida possível. Numa empresa pública já não é assim. Não é aceitável que alguém seja despedido por não pensar de acordo com aquilo que é politicamente correcto. Uma situação destas leva-nos de novo para o antigo regime em que era obrigatório assinar uma declaração em que se declarava anti-comunista, para ser possível integrar a função pública. O princípio é o mesmo. Só muda a ideologia. Antes era impensável que algum “vermelho” estivesse, por exemplo, na RTP. Se há alguma vantagem inegável num sistema democrático é a imposição de não se impor uma ideologia única e infalível. E é precisamente essa capacidade que torna a democracia, numa perspectiva churchiliana, o pior dos regimes à excepção de todos os outros. Ser tolerante e aceitar os que pensam como nós é fácil e não tem grande valor. Em qualquer ditadura se faz isso. É na aceitação, e inclusive na protecção, do direito do outro a pensar distintamente que reside a autoridade moral das democracias. E este direito é, a meu ver, necessariamente universal, trate-se de figuras públicas ou não. Posso não concordar com as declarações em causa, um misto de meias-verdades e generalizações insultuosas, e estou no meu direito de julgar a pessoa em causa por causa daquilo que pensa. Mas não posso, ou melhor, não devo, puni-lo por isso. Dizes no post que a BBC era de alguma forma representada pelo seu apresentador e como tal ele era um prolongamento da empresa mesmo fora do programa. É óbvio que enquanto está, no cumprimento do seu trabalho, a apresentar o seu programa, ele está em representação da empresa e tem uma série de responsabilidades como tal. Mas a entrevista foi dada a nível pessoal, enquanto cidadão livre e não enquanto porta-voz da BBC. Ao contrário do que escreves no post não creio que “O apresentador é como um prolongamento da empresa”. Um contrato de trabalho não passa disso mesmo, do trabalho. Ao iniciar um emprego numa empresa não é aceitável que me exijam, para além do trabalho, uma anulação das capacidade de raciocínio individual ou a demissão daquilo que são as minhas convicções. Não seria ético nem da parte do empregador nem da parte do empregado. Um contrato de trabalho não é a venda da alma ao diabo.
Olhando para trás reparo que o post ficou um pouco mais extenso do que desejava. Mas espero que tenha servido para esclarecer o porquê da minha posição.
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