O Diva de Portugal

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sábado, fevereiro 07, 2004

Alguma vez viste o olho de um peixe morto? (Pequeno Conto)

"Sinto-me como peixe sem água para nadar, apenas com ar para sufocar, a voz dele tremia, a rouquidão e os anos chamavam-se a si próprios num tom de voz apagado. A figura à minha frente era um homem apagado. Não era, sem dúvida, a pessoa que eu conhecera e que esperava encontrar ali, a meu lado, no café da piscina onde nadava diariamente. Encontrara-o, mas tão diferente... diria ter ficado chocada, mas não me pude dar a tal luxo, afinal, dar-me a tal liberdade, era expô-la também a ele.
Alguma vez viste o olho de um peixe morto, perguntou-me. O som da palavra peixe em pareceu-me frio, quase como se a personagem mastigasse um pedaço suculento de um.
Nunca, nunca reparei, respondi. E ele olhava-me meio desiludido, meio triste com o que ouvira e o que ia dizer, mas continuava. Bem, não há vida nele... não há cor, não há vida, não há qualquer brilho. Não há nada. Quase que pudemos ver a morte, horrorosa, espelhada naquele olhar de nenhum para o nada. Quase...
Parecia-me angustiado com a sua constatação. Como era bem o seu nome, perguntei-me num súbito esquecimento de qual não era culpada. Não o encontrava e quando encontrei, achei-o estranho, achei o meu também estranho, achei todas as palavras estranhas, até as imagens da memória. Enfim, não mais pude que, também, pensamento estranho ter. Ele, sim ele, era como concentrado de anjo em lata de atum, era uma boa pessoa, em suma. Podia ter achado tais palavras tolas, não achei. Podia ter-me rido delas, não ri. Pensei, apenas, um pensamento estranho. Soltei umas parcas palavras de carinho, enquanto lhe afagava a testa, o cabelo caiado de um branco cinza que teimava em cobrir o negro dos seus cabelos. E ele sorriu..."

Ass: PM